sábado, 18 de abril de 2020

TRAJETÓRIAS DE VIDA E DE TRABALHO FLEXÍVEIS: O PROCESSO DE TRABALHO PÓS-BRAVERMAN


RODRIGUES, Maria Beatriz. Trajetórias de vida e de trabalho flexíveis: o processo de trabalho pós-Braverman. Caderno EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v.12, n.4, 2014.

1)           CONTEXTO/ PROBLEMATIZAÇÃO

Muitas mudanças ocorreram no processo de trabalho desde a publicação do livro “Trabalho e Capital Monopolista” de Harry Braverman. No ano de 1973 ocorreu a crise energética mundial que modificou as relações econômicas, comerciais e como consequência, as produtivas e de trabalho. A crise encontrou grandes empresas e conglomerados, com salários elevados e sindicatos fortes, característica que as impedia de continuar com o mesmo tipo de estrutura e competir em um mercado inflacionado. A indústria pós-Fordista representou uma alternativa no momento de crise, por representar a busca por maior produtividade com menos recurso, com relações mais diretas entre o trabalhador e o produto do seu trabalho. O principal exemplo, é o Modelo Japonês ou Toyotismo, que introduz conceitos como participação da mão de obra, produção centrada em times, ou células de produção, ênfase no controle de qualidade e melhorias em cada posto de trabalho.

Com a prosperidade da indústria japonesa no anos de 1980 e 1990, o modelo foi difundido no mundo como a melhor alternativa para introduzir novos critérios de competitividade, requeridos pela globalização. Levando consigo grandes mudanças nas relações de trabalho, com o uso da flexibilização de contratos onde há convivências entre trabalhadores centrais para a produção e subcontratados, concentrando esforços nas atividades-fim e terceirizando as atividades-meio. A demanda por multifuncionalismo e multiqualificação coloca no centro a flexibilização do trabalho, transformando em tema recorrente nas discussões em ciências sociais há pelo menos três décadas.

2)           RELEVÂNCIA E JUSTIFICATIVA

O que torna a pesquisa relevante e a justifica é o fato dos autores terem convicção de que há um aprofundamento no uso das formas de flexibilidade do trabalho como estratégia produtiva, com consequências tanto para o trabalho quanto para os trabalhadores.

3)           PROBLEMA DE PESQUISA, OBJETIVO GERAL E ESPECÍFICOS

A principal indagação da pesquisa refere-se aos impactos da flexibilidade nas relações de trabalho desde o início da sua aplicação.
O artigo parte de uma realidade conhecida, que é crescente a flexibilização do mercado de trabalho, e discute as consequências dessas mudanças para a vida dos trabalhos.
Para atingir esse objetivo ele recorre a duas trajetórias de pesquisas, no Brasil e na Itália, por representarem exemplos clarosda evolução pós-Braverman. A discussão e baseada em experiências pessoais e profissionais na Itália desde 1988, assim como as trajetórias de pesquisa sobre as relações de trabalho no modelo japonês de organização da produção desde o final dos anos de 1980 no Brasil.

4)           REFERENCIAL TEÓRICO

Tópicos
Detalhamento
Autores
Introdução
Críticas e reconhecimento sobre a influência do livro "Trabalho e Capital Monopolista de Harry Braverman
O trabalhador flexível tem "vida líquida"
Altos níveis de rotatividade, tanto o trabalho como o trabalhador parecem dercaráveis
Análise de conteúdo
Mudança significativa nos postos de trabalho no Brasil
Na Itália cresce o uso da ferramenta de flexibilização do trabalho
A flexibilidade exige mudanças constantes no estilo de vida do indivíduo
Litter e Salamn (1982)
Bauman (2005)
Gonzaga (2003)
Moraes (2003)
Rodrigues (1991, 2001)
Passalacqua (2007), Mariucci (2005), Fontana (2002)
Bauman (2005)
De Braverman ao Pós-Fordismo
Críticas a Braverman
Mudanças nas organizações, cisão entre propriedade e comando
Organizações tornan-se mais complexas e mais "departamentalizadas"
Braverman foi chamado de "coruja de Minerva" por olhar para a industria do passado
Fordismo
Modelo Japonês ou Toyotismo
Trabalhadores centrais e trabalhadores periféricos
Impactos no trabalho pós-fordista
"Capitalismo flexível" e flexibilidade organizacional
Mundo ocidental pós guerra fria é um mundo capitalista e liberal
"Mudanças em aspectos íntimos da vida pessoal estão diretamente ligados ao estabelecimento de conexões sociais de grande amplitude"




Meiksins (1996)
Braverman (1974)
Janoski e Lepadatu (2014)
Wood (1991)
Graham (1996)
Shonberger (1992), Oliver e Wilkinson (1998), Sayer (1986)
Sennet (1999)
Fukuyana (1992)
Giddens (2002)
Notas sobre a flexibilização do trabalho no Brasil
As indústrias no Brasil no século XIX/ XX
Desenvolvimento capitalista brasileiro
Produção ou organização flexível
Modelo "enxuto" de reestruturação da produção
Rotatividade a despeito de leis que favorecem os trabalhadores em disputas trabalhistas
Reestruturação produtiva das empresas brasileiras
A flexibilização do trabalho e as mudanças complexas que atingem o estilo de vida do trabalhador
Fim do trabalho
Utilização de mão de obra atípica
Classificação dos tipos de flexibilidade do trabalho
Humphrey (1987)
Antunes (2006)
Rodrigues (1991, 1993, 2001)
Gonzaga (2003)
Pochmann (2012)
Ibid (p.2)
Bauman (2005)
Rifkin (2004) e Antunes (1995)
Pochmann (2006), Kóvacs (2004), Noronha (2003), Mariucci (2005)
Atkinson (1984), Atkinson e Meager (1986)
Piccinini, Oliveira, Rubenich (2006)
Trajetórias de vida e de trabalho flexíveis no Itália
A história do trabalho flexível na Itália
Análise de conteúdo
Dificuldade de planejamento de vida privada
Tapia (2003)
Tapia (2003), Vasapollo (2006)
Moraes (2003)
Istat (2006)
Considerações finais: Vivendo a vida flexível
As empresas flexibilizam e o esforço de se adaptar recai sobre o indivíduo
As caracteristicas do trabalho tradicional são alteradas ou deixam de existir no trabalho flexível
Menor utilização dos postos de trabalho
Diminuição dos postos de trabalho e aumento vertiginoso da produtividade no mundo
Novas interprestações para o trabalho
"Modernidade e vida líquidas"
A mudança não se adapta nem às expectativas nem ao controle humanos
Dificuldade de trajetórias pessoais mais definidas
Sennet (1999)
Vasapollo (2006)
Antunes (1995, 2006), Rifkin (2004), Sennet (1999)
Rifkin (2004)
Bauman (2005)
Giddens (2002)
Ibid (p. VIII)

5)           METODOLOGIA

Elementos de
Pesquisa
Descrição
Autores
Tipo de Pesquisa
Descritiva
-
Abordagem
Qualitativa
-
Método
Estudo de caso, pesquisa bibliográfica e documental
-
População
Na Itália - depoimentos de 1537 pessoas sobre experiências decorrentes da flexibilização dos contratos de trabalho no país
-
Amostra
Na Itália - foram escolhidos 153 do total de depoimentos pelo significado concreto mas também vivencial
-
Unidade de Análise
Impactos da crescente flexibilização nas relações de trabalho
-
Unidade de Observação
Trabalhadores do Brasil e Itália
-
Sujeitos
Trabalhadores
-
Coleta de Dados
- Para discussão no Brasil, foram utilizados dados de pesquisas sobre adoção do modelo japonês de gestão em grandes empresas do Rio Grande do Sul, realizados entre 1990 e 2001
- Para ilustrar o caso italiano foi utilizado material empírico de um blog, proposto por jornal de grande circulação nacional, que envolveu o depoimento de 1029 pessoas sobre experiências decorrentes da flexibilização dos contratos de trabalho no país
-
Análise de Dados
Análise de Conteúdo
Moraes (2003)
6)           RESULTADOS

O estudo coloca os desafios que a flexibilização leva para as relações de trabalho. O foco foi analisar o depoimento de trabalhadores submetidos a contratos atípicos de trabalho que encontram dificuldades no dia a dia da sua vida prática. Foi verificado que esses trabalhadores sentem pouco representados pelos sindicatos e desvalorizados em suas qualificações. Por outro lado os sindicatos demonstram dificuldades em atingir esses trabalhadores que ficam isolados e pulverizados entre muitas categorias. O Estado enfrenta limitações na decodificação dos determinantes e das consequências da precariedade dos contratos. Esses desencontros levam a vivência nas empresas de trabalho precário, sem perpectiva de futuro e com grande insatisfação dos trabalhadores.

7)           CONSIDERAÇÕES FINAIS

As empresas flexibilizam para se adaptar aos mercados e evitar a rotina burocrática, porém esse esforço recai sobre os indivíduos, que precisam mudar as formas conhecidas e seguras de trabalhar e se relacionar com o mercado de trabalho.

Desde o início do século a perda de postos de trabalho é uma questão que têm ocupado a agenda dos países em vários continentes, a produtividade cresce e provoca perdas nos postos de trabalho. O trabalho tem se transformado e exigido novas leituras.A flexibilidade organizacional gera melhorias contínuas e o nível de exigência é sempre atualizado, novas qualificações são requeridas e permanecem novas por pouco tempo.

A flexibilidade é parte de um processo lógico das relações de trabalho, uma transformação gradual e decorrente de solicitações econômicas e sociais às organizações e aos trabalhadores. A vida mudou de forma drástica e as garantias de estabilidade desapareceram. Como consequência temos a redução do número de trabalhadores diretos com a escolha das empresas recaindo nos contratos temporários e os trabalhadores impactados nas suas trajetórias de vida.

8)           APRECIAÇÃO CRÍTICA

A flexibilidade trouxe mudanças importantes nas relações de trabalho e sobre o trabalhador recai o maior ônus e o desafio de se adaptar a essa nova realidade. Esse trabalhador agora precisa se reinventar e se aperfeiçoar constantemente para estar apto ao mercado.O lado perverso da flexibilização é a dificuldade do trabalhador em definir seus objetivos pessoais e zelar pela sua subsistência.

A flexibilidade pode criar novos postos de trabalhos, mas até que ponto o trabalhador deve se sujeitar a esse tipo de colocação com garantias mínimas e redução de direitos? 

É possível pensar em modelo de flexibilização que atenda aos objetivos da organização mas que possa também trazer benefícios ao trabalhador?

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