RESENHA: ROCHI, C. C.;
BANDEIRA, N.; MELO, J. S. M.; OLIVEIRA, R. D. O Discurso Organizacional:
Constructo Sedutor para Apreensão de Talentos. Revista Espacios, vol.
37 (Nº17), Ano 2016 p 20, 2016.
Guilherme Augusto de Oliveira Freire
(1)
Contexto/problematização
relacionado ao tema.
O artigo trata a respeito da atuação da
gestão no que concerne à atração e retenção de talentos nas organizações. Nesse
sentido, os autores problematizam o discurso e o modelo de apreensão de
talentos adotados pelas empresas, apontando as tensões e os dilemas éticos
presentes nas narrativas organizacionais que buscam atrair os profissionais.
Eles ainda destacam a potência do discurso favorável às organizações e seus
valores nas sociedades modernas, apontando as consequências desse quadro e as
pressões infligidas ao indivíduo.
(2)
Relevância e justificativa.
O artigo busca analisar as estratégias
adotadas pelos discursos organizacionais, portanto, compreende-se que sua
relevância encontra-se na exposição dos mecanismos e artifícios utilizados nos
processos de seleção das empresas. Assim, a pesquisa empreendida justifica-se
pela importância teórica, visto que a produção e a reprodução dos discursos
acompanha sempre um conteúdo político e social que influencia a organização da
sociedade.
(3)
Problema de pesquisa, objetivo geral e específicos.
O
artigo traz dois problemas de pesquisa, que estão relacionados entre si, para
nortear sua discussão. São eles: “o homem
está preparado para levar a extremos vitais as ressonâncias do ato ilocutório
organizacional? O indivíduo se coaduna nesse dualismo desenfreado de conflitos
substanciosos entre o discurso sedutor e as práticas permeadas no ambiente
organizacional?”.
O objetivo geral do artigo é realizar
uma análise do discurso organizacional voltado para a apreensão de talentos.
São delineados três objetivos específicos: “(i) analisar o discurso
organizacional e a modelagem de apreensão de talentos; (ii) categorizar o discurso
da grande empresa no processo de contratação de pessoas; e (iii) avaliar as
categorias de discurso e suas ressonâncias”.
(4) Referencial
teórico.
Tópicos
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Detalhamento
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Autores
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A organização como constructo performático
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-Reflexão
sobre o discurso organizacional e seus efeitos na realidade social e psíquica
do indivíduo, destacando a posição de protagonismo das empresas na sociedade
e sua capacidade de manipulação;
-Ambiente
organizacional e contexto hipermoderno: forte enfoque no mérito pessoal e no
esforço individual dos trabalhadores;
-Organizações
como espaço de controle (formal e informal), seu discurso como ideológico e
seus efeitos na realidade do sujeito.
|
Enriquez
(1991; 1997; 2000; 2001), Prestes Motta (1991; 1992); Freitas (2000, 2006), Gaulejac
(2007), Willmott (1993); Adorno e Horkheimer (1985); Althusser (2000), Takeuti
(2002), Lapierre, (1989), Chanlat (2007).
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O ato ilocutório da organização: uma instância narrativa de sedução
|
-Aprofundamento
na narrativa construída pelas organizações e nas implicações do discurso
ideológico organizacional como legitimador de um sistema normativo e de ação;
-Foco
nos mecanismos utilizados pela narrativa da organização: eficácia,
desempenho, produtividade;
-Adesão
e defesa do homem organizacional aos valores e ideais da organização,
tornando o sujeito fragmentado;
-Ato
ilocutório: discurso dominante da organização para atrair talentos revela
idealização dos grupos e sobreposição da identidade dos indivíduos.
|
Freitas
(2000), Gaulejac (2007), Enriquez (2000), pagès et al. (1987), Chanlat
(2007), Prestes Motta (1984; 1991; 2000), Sennett (2004).
|
Discurso organizacional: paradoxo da mãe
protetora?
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-Paradoxo
organizacional: discurso da mãe protetora: a organização como benfeitora que
ensina o caminho da “verdade”;
-Ideologia
nunca é assumida: organização “apenas” segue “cobranças do mercado”;
-Servidão
voluntária ou a adesão de todos: o indivíduo e o coletivo assumem para si a
lógica apregoada pela gestão;
-
Inconsistências entre o que é apregoado pelo discurso e o que é vivido na
prática pelo indivíduo.
|
Amado
(2000), Lipovetsky (2004),
Prestes
Motta (1992),
Gaulejac
(2007),
Vasconcelos
e vasconcelos (2004),
Enriquez
(2008).
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(5)
Metodologia.
Elementos da
pesquisa
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Detalhamento
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Autores
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Tipo
de pesquisa
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Exploratória
e descritiva
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-
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Abordagem
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Qualitativa
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-
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Método
de pesquisa
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Pesquisa
teórico-bibliográfica e documental.
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-
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População/Amostra
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Seleção de vinte maiores empresas transnacionais, em diversos
segmentos da economia. Amostra intencional - cinco empresas transnacionais do
setor industrial.
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--
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Unidade
de Análise
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Analisa a linguagem contida nos discursos das empresas
transnacionais selecionadas - recorte temporal: maio 2013 a junho de 2014.
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-
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Unidade
de Observação
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--
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-
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Coleta
de Dados
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Publicações realizadas nos sites e
materiais de divulgação das empresas.
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Dinheiro (2012).
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Análise
de Dados
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Análise
de discurso
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Van
Dijk (2001), Fiorin (1993) E Orlandi (1999).
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(6) Resultados.
As empresas analisadas foram aleatoriamente
nomeadas como: Organização Alfa, Beta, Delta, Gama e Ômega. Dentre os
resultados expostos, estão:
-Para
a Organização Alfa: houve maior frequência nas Categorias A (compartilhamento
ilocutório) e E (espaço de excelência) com aproximadamente 71,50%;
-Para
a Organização Beta: Categoria D (organização aprendiz) com 83,33% e B (meritocracia)
com 66,66% foram as de maior relevância, respectivamente;
-Para
a Organização Delta: Categoria C (qualidade de vida), com frequência aproximada
em 71,50% e Categoria A (compartilhamento ilocutório), com a frequência de
85,71% foram as mais representativas do discurso;
-Para
a Organização Gama: predominância da Categoria D (organização aprendiz), com
100% das análises relatadas e, ainda, Categorias A (compartilhamento
ilocutório) e E (espaço de excelência), com 80%;
-Para
a Organização Ômega: maioria da Categoria A (compartilhamento ilocutório), com
frequência constante de 100% nos discursos e Categoria E (espaço de excelência)
com 83,33%.
(7)
Considerações finais.
Os autores do artigo apontam, em suas
considerações, que o discurso organizacional é construído a partir de uma
estética que enfatiza o poder e a onipotência corporativa. Esse discurso constrói,
portanto, uma perspectiva idealizada onde a organização é protagonista da
excelência e o trabalhador é privilegiado por poder fazer parte dela. Eles
expõem ainda que, nessa narrativa, a qualidade de vida ao trabalhador fica
relegada ao segundo plano e que ganha ênfase a valorização da era do
conhecimento. Por fim, conclui-se que o discurso construído no mundo
corporativo é propositalmente formulado para seduzir e controlar os sujeitos, a
fim de torná-los parte de sua dinâmica empreendedora.
(8) Apreciação
crítica - duas perguntas.
O artigo traz considerações importantes a
respeito do discurso organizacional. Mesmo tendo o enfoque na apreensão de
talentos, ou seja, na seleção de profissionais pelas empresas, as reflexões
realizadas têm implicações até mais amplas. A realidade da perda de referência
de si mesmo, ou seja, a substituição dos valores do sujeito pelos valores da
organização, discutida no artigo, têm grandes repercussões na construção da
identidade e da ética do trabalhador. A adesão aos valores e a defesa desses
valores por parte dos sujeitos sem a devida apreciação crítica por conta da
força dos mecanismos manipulativos utilizados nas narrativas construídas pelas
corporações é uma realidade com profundas implicações políticas e sociais no
mundo atual. Seguem as perguntas:
-O
artigo tem enfoque na análise do discurso organizacional de empresas do setor
industrial para seleção de talentos, contudo, traz em suas considerações a
percepção de que a narrativa construída extrapola simplesmente o objetivo de
atrair profissionais. Em se tratando do discurso organizacional que as grandes
corporações constroem no mundo capitalista, poderíamos inferir que certos
valores corporativos (como meritocracia) estão se infiltrando na vida social?
Quais as consequências disso?
-Se entendemos que o
discurso organizacional atua na manipulação dos indivíduos a fim de impelir um
sistema normativo e de ação, conforme destacam os autores do artigo, que leitura
crítica podemos fazer da atuação e do papel das grandes corporações em projetos
de cunho social?
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